Ernesto passou pouco mais de 800 dias à frente do Itamaraty e vinha sendo contestado dentro e fora do governo. Na visão de parlamentares, especialistas e empresários, a atuação do chanceler na pasta prejudicou o País na obtenção de vacinas contra a covid-19.Ernesto cancelou compromissos nesta segunda-feira com autoridades estrangeiras para discutir seu futuro. E foi chamado de última hora por Bolsonaro no Palácio do Planalto. Na reunião, segundo aliados, o ministro disse ao presidente estar disposto a deixar o cargo para não ser mais um problema para o governo na relação com o Congresso. Auxiliares diretos do ministro consideram que a situação é “irreversível”.

A demissão está sendo discutida, mas Bolsonaro ainda não escolheu o substituto. O nome mais forte no Palácio do Planalto é o do almirante Flávio Rocha, atual secretário de Comunicação Social e da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE). Rocha, que tem o apoio do ministro das Comunicações, Fabio Faria, é considerado habilidoso, já cumpriu missões em nome de Bolsonaro na Argentina e na China em momentos delicados na relação com esses países e fala cinco idiomas. É atribuída ao militar todo o recuo que o presidente faz quando radicaliza o discurso.

No Itamaraty e na Marinha, contudo, há resistências porque sua nomeação colocaria um almirante da ativa na linha de frente do governo. A situação seria semelhante a de Eduardo Pazuello, que assumiu o Ministério da Saúde como general da ativa e, nesta condição, não teve condições de contrariar o presidente em momentos importantes da pandemia.

No período da ditadura (1964-1985), seis nomes ocuparam o ocuparam o Itamaraty, mas apenas um deles foi militar. O general Juracy Magalhães de janeiro de 1966 a março de 1967. É dele a célebre frase: “O que é bom para os Estados Unidos, é bom para o Brasil”. Ele também tinha uma carreira político e já havia sido antes governador da Bahia.

Uma ala do Palácio Planalto, porém, defende um político para o cargo, de preferência um senador, a exemplo do que ocorreu no governo de Michel Temer. Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) e José Serra (PSDB-SP) comandara o pasta de Relações Exteriores.

Uma teceira opção é promover alguém da carreira diplomática. O nome cogitado é o do embaixador do Brasil na França, Luiz Fernando Serra. O diplomata, porém, indicou a colegas que não gostaria de deixar Paris neste momento para voltar ao País.

A pressão sobre Ernesto aumentou neste domingo, depois que o ministro acusou a senadora Kátia Abreu (Progressistas-TO) de fazer lobby de chineses durante almoço com ele no Itamaraty. Com o gesto, ele forçou novo embate entre o governo Bolsonaro e o Congresso Nacional. Presidente da Comissão de Relações Exteriores, a senadora disse que apenas defendeu que não haja discriminação à China no leilão do 5G e chamou o ministro de “marginal”. Ela recebeu apoio expressivo de congressistas que já cobravam a demissão de Ernesto.

A tese dos interesses chineses por trás da queda de Ernesto já vinha sendo apontada nos bastidores por aliados do ministro no governo e por militantes conservadores nas redes sociais.

A declaração do ministro, no Twitter, foi interpretada como gesto “suicida” por diplomatas, e uma forma de construir uma versão para justificar sua saída do cargo. Parlamentares e diplomatas avaliam que o ministro teve apoio do clã Bolsonaro nessa contra ofensiva. Ele tem apoio público do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o filho do presidente que mais interfere na política externa.